John Pizzarelli volta ao Brasil e reafirma sua devoção ao jazz clássico
- Julio Maria

- há 7 dias
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John Pizzarelli, um dos maiores guitarristas do standard jazz em atividade, volta ao Brasil para uma série de shows: “Adoro compor, mas tenho ganhado a vida tocando a música de outras pessoas”. Mesmo sem estar ligado a uma instituição do poderio da Jazz at Lincoln Center Orchestra, John Pizzarelli faz pela guitarra do swing jazz o que Wynton Marsalis tem feito há anos pelas big bands. Aos 65 anos, o filho do também guitarrista Buck Pizzarelli não só reavalia standards do American Songbook, como amplia a lista, extraindo de campos diferentes da música popular sutilezas escondidas que não ouvíamos da mesma forma até ele chegar com suas regravações. O conservadorismo de Pizzarelli tem algo de revolucionário.
Ele volta ao Brasil para uma série de apresentações. Quarta, 22 de outubro, e sete dias depois, dia 29, toca na casa Bourbon Street, de Moema, que já visitou outras vezes. Quinta, 23, segue para o Rio, onde ocupa o Vivo Rio. E segue para Porto Alegre (dia 24) e Belo Horizonte (dia 26). O repertório desta vez estará ancorado no álbum mais recente, Stage & Screen, lançado em 2023, com temas extraídos de trilhas sonoras usadas para peças da Broadway e filmes de Hollywood.
Pizzarelli falou à Revista Jazzify. Stage & Screen é um álbum de temas sedutores, com tempos médios e rápidos, que deixam sua guitarra em ebulição o tempo todo, acolhida por baixo acústico, piano e bateria. Ele já abre com “Too Close for Comfort”, de Jerry Bock, George David Weiss e Larry Holofcener, de 1956, elevada a standard eterno no musical Mr. Wonderful, com Sammy Davis Jr. E segue com “I Love Betsy”, que Jason Robert Brown fez para o musical Honeymoon in Vegas, na Broadway, em 2015, e a ligeira “I Want to Be Happy”, que Vincent Youmans criou em 1925 para o espetáculo No, No Nanette. Tudo atemporal e de alta temperatura.
Outros temas seguem, menos ou mais conhecidos, como “Tea for Two”, “Just in Time”, “Some Other Time” e até “As Time Goes By”, clássica e talvez mais famosa do que o próprio filme que a revelou, Casablanca, de 1942, composta por Herman Hupfeld em 1931.
Tudo parece colocar Pizzarelli em sua sala de estar, sem maiores desafios. Perguntado justamente se haveria algum desafio no repertório do disco, ele diz: “As coisas boas vêm com facilidade! Ao escolher as músicas, vi que elas se enquadravam em duas categorias: palco ou tela, e eu tinha o meu tema!”.
Pizzarelli centra sua carreira em versões. Em álbuns anteriores, deitou improvisos sobre obras de Paul McCartney, com e sem os Beatles, Joni Mitchell, Neil Young, Tom Waits, Pat Metheny, Frank Sinatra e Tom Jobim (para ele, a bossa nova tem o mesmo peso do jazz).

Foto: Ted Kurland Agency
Digo a ele que Gilberto Gil já declarou que não precisa mais compor novas músicas porque existem no mundo uma infinitude de coisas maravilhosas que ele ainda quer cantar. Seria o seu caso? “Eu adoro compor músicas. Ainda componho sempre que preciso gravar, mas tenho ganhado a vida tocando músicas de outras pessoas.” É justamente o argumento que muitos músicos autorais usam para detratar intérpretes. “Ganhar a vida” com a obra dos outros, para eles, seria o caminho mais fácil.
Saído de uma família com irmãos, tio e pai músicos excepcionais, que lhe deram subsídios para desenvolver técnicas como a da guitarra tocada com o rasqueado dos banjos no jazz dos anos 40, como ele teria encontrado sua voz? Por similaridade de inflexão, sem esforços e sempre muito próxima à sua voz de fala, pergunto se Chet Baker foi uma influência. Ou, se não, quais seriam?
“Nat King Cole foi a maior influência vocal, junto com Michael Franks e Kenny Rankin. Chet Baker veio um pouco mais adiante.” Curioso Nat, uma voz negra de natureza rara, praticamente inatingível, ser uma referência sempre citada em suas entrevistas. Mas, certamente, ele se refere ao pensamento do canto de Nat, não ao seu timbre.
Entro em detalhes sobre a guitarra e pergunto, por curiosidade quase infame a um instrumentista de jazz vintage, se ele já tocou em uma guitarra Fender Stratocaster ou Telecaster, dois símbolos que só viriam a se consolidar mais tarde e em outro universo, no blues e no rock dos anos 70. E, ainda, se a natureza das guitarras pode definir por antecipação o som dos guitarristas. “Eu costumava tocar uma Stratocaster quando estava em bandas de rock na minha adolescência e nos meus 20 anos. Gosto de certas guitarras para certos cenários, e é por isso que toco uma Archtop para jazz.”
John Pizzarelli declarou em outras entrevistas que os músicos jamais deveriam levar partituras para os shows. “Eles devem estudar e deixar essas coisas em casa. Só subir ao palco quando tiver tudo na cabeça.” Conto a ele sobre o músico brasileiro Hermeto Pascoal, morto em setembro, e de sua postura parecida e ainda mais radicalizada: ensaios exaustivos só servem, segundo Pascoal, para proteger músicos que não sabem improvisar e criar na hora do show. Pizzarelli pontua: “Acho que o ensaio é importante no início da criação de um grupo. E acho que ouvir seus heróis, praticar o que você ouve e aplicar isso ao seu próprio som é tão importante quanto aprender escalas e outras coisas.”
Mas o guitarrista confessa que, agora, tem levado as letras das canções para o palco. “Agora eu levo as letras comigo. Não faz sentido não cantar as palavras certas. Mas, quanto à parte musical, as músicas não são tão difíceis de memorizar depois de algumas tentativas.”
Sobre outras homenagens ou discos autorais que estejam em produção, o músico é perguntado sobre um antigo projeto no qual gravaria temas da gravadora Motown, que lançou, nos anos 60 e 70, nomes como The Supremes, Marvin Gaye, Stevie Wonder e Smokey Robinson. Ele não responde a isso, mas fala de outra ideia: “Estou analisando uma possível homenagem ao Tony Bennett, mas nada é definitivo.”











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